Vocês se lembram de um caso que ocorreu no Rio há oito meses atrás, quando um homem, que achava-se traído pela esposa resolveu mantê-la, juntamente com mais 38 vítimas, sob a mira de uma arma dentro de um ônubus durante mais de 10 horas?
Então, como foi divulgado, a digníssima esposa acusada pelo marido de "puladora de cerca" resolveu perdoá-lo e voltou para seus braços. Resolveu desconsiderar as muitas agressões físicas que sofreu diante da brutalidade e do descontrole emocional do marido.
Bom, isso não causa espanto algum a alguém que labute na Polícia. Diariamente, em todas as Delegacias, chegam casos de mulheres que foram agredidas por namorados, maridos, amantes, filhos, pais. Lesões das mais variadas, especialmente nos braços e rosto. Olhos roxos e inchados, dentes quebrados, lábios cortados. Denunciam que o homem é viciado, alcoólatra, e que tem uma arma em casa. Daí quando o sujeito vai preso, é só contar as horas, daqui a pouco vem elas, trazendo ventilador, roupas limpas e colchonete. - "Pode entregar pro fulano, ele pode estar passando frio...". Não, não estou contestando a nobre atitude do perdão, acho até que essas mulheres tem um coração muito grande pois são humanas o suficiente para continuar querendo o bem até mesmo de seu agressor.
O problema é outro, e cansamos de ver também, infelizmente. Não para por aí. Vão-se alguns meses após o reestabelecimento da relação, muito amor, muito carinho. Até que um dia, porrada na pobre mulher de novo. Delegacia de novo. O que tem que se entender é que, se um cara espanca a mulher, das duas uma: ou está dominado pelas drogas (mais frequentemente o álcool nestes casos), ou acabou-se o respeito. Ou faz tratamento contra a dependência ou... não tem "ou", se não tem respeito já era. Não adianta a mulher amar de paixão o sujeito, pois a violência doméstica vai tornar-se uma constante, a ponto da mulher nem mesmo se dar mais ao trabalho de procurar uma Delegacia.
É uma situação delicada, estamos lidando com o sentimento desses seres humanos do sexo feminino, mas independente da "barreira psicológia anti-emotiva" que todo policial acaba desenvolvendo cedo ou tarde, analisando racionalmente, antevemos novas tragédias.
A mulher enquanto sociedade tem feito esforços nas últimas décadas para ser valorizada e tratada com igualdade de direitos com os homens. Ao mesmo tempo, uma grande massa de jovens mulheres resolve voltar ao tempo da "coisificação" da mulher, sujeitando-se a ser humilhada e tratada como lixo ao mesmo tempo que "dança o funk" por aí. São contrapontos que marcam nossa sociedade atual, a divisão das massas.
Há algum tempo eu li no site Flávia Farias um texto muito bom do Delegado de Polícia Evandro Francisco de Farias (*), onde é feita uma narrativa das leis que foram sendo criadas e na piora da situação da mulher vítima de violência doméstica. O texto não é novo, e depois dele veio a Lei Maria da Penha, então fica mais para registro histórico do desserviço que o legislativo presta em nosso vilipendiado país.
Com a nova lei a Polícia pode prender o agressor, já que a pena máxima é maior do que os 2 anos acobertados pela lei dos Juizados. O agressor ficará trancafiado no mínimo tempo suficiente para que a mulher saia de casa com suas coisas e filhos em segurança, e procure recomeçar sua vida com a ajuda de familiares. Mas, em grande parte dos casos reais a mulher nem trabalha, apenas cuida dos filhos, e se sair de casa vai passar fome, então acaba se sujeitando às agressões, aguardando a libertação em breve do marido.
Nisso tudo podemos verificar diversos aspectos. A mulher, que mesmo empregada, tendo condições de seguir a vida, volta para o agressor. Ou a mulher que, derrotada pelo dascaso governamental vive na miséria e apanhando do marido alcoólatra/drogado. Nada disso é bom, a sociedade está doente em diversos aspectos, não é só o tráfico de drogas que destrói o Rio. Cada decisão tomada tem um efeito.
As mulheres não podem abrir mão do que foi conquistado, não podem submeter-se a "arrebitar a bundinha a descer da boquinha da garrafa", essa brincadeira sai caro, acredite. Têm-se que cobrar do governo que este cumpra seu papel, instruindo e dando amparo às vítimas. Ou fecha-se mais um caixão, e daqui a pouco lá estou eu redigindo mais uma Guia de Remoção de Cadáver... sério. (*) - Copiei na íntegra o texto mencionado pois o site onde está hospedado foi feito todo em flash e não dá pra direcionar um link. Está aí para quem quiser ler. A participação deste subscritor neste post encerra-se por aqui. "A MULHER É ESPANCADA E A LEI PIORA? por Evandro Francisco de Farias - Delegado de Polícia e Professor | Rio de Janeiro - RJ
Antes de 26 de setembro de 1995, quando uma mulher era espancada por seu marido, companheiro, namorado, etc., e comparecia à Delegacia dos “Homens”, estes procuravam prender o agressor, bem como o Delegado o autuava em flagrante delito, colocando-o no xadrez e arbitrando-lhe uma fiança. Esta, embora pequena, fazia com que o agressor permanecesse trancafiado pelo menos por um dia. De modo que a vítima pudesse voltar para casa, junto de seus filhos ou procurar a casa de parentes, uma vez que o agressor encontrava-se imobilizado de continuar a agredi-la, ainda que temporariamente.
A partir da data supracitada, com a vinda da Lei 9.099 de 1995, a situação da mulher piorou. Esta lei agasalhou todos os delitos, chamados de pequeno potencial ofensivo, com penas até 1 (um) ano, não mais permitindo que a Autoridade Policial prendesse, autuasse e encarcerasse os agressores de mulheres.
A mulher que ousar ir à Delegacia para registrar o fato contra seu agressor e a Polícia conseguir conduzi-lo à presença da Autoridade. Este, imediatamente, apenas preencherá um formulário (RO) e libertará prontamente o agressor, o qual poderá sair da Delegacia, antes mesmo de sua vítima e dos PMs que o trouxeram, indo para casa espancar a vítima uma segunda vez, agora, contudo, por ter “dado queixa” contra ele!
O legislador, predominantemente masculino, rindo da desgraça das mulheres, bolou a lei 10.778, de 24 de novembro de 2003, estabelecendo que qualquer médico que conhecer mulheres vítimas de agressões, deve comunicar compulsoriamente às Autoridades. Lei desconhecida pelos médicos e que nada trás de benefício para evitar as agressões, tendo em vista que mesmo comunicando, ocorrerá a desmoralização narrada no parágrafo anterior.
Para rir mais ainda da vítima feminina de agressão, sabidamente pobre e sem telefone, os Legisladores masculinos elaboraram a Lei 10.714 de 13 de agosto de 2003, disponibilizando, em nível nacional, um número telefônico para atender às denúncias de violência contra a mulher. Há há há há! Ninguém sabe o número!
Bom, pelo menos alguma coisa foi feita para aliviar a vítima de violência doméstica. Chegou a Lei 10.455, de 13 de maio de 2002, que acrescentou ao Parágrafo Único do art. 69 da lei 9.099 de 1995, texto autorizando o Juiz a determinar o afastamento do autor da agressão do lar, se a mulher quiser. Não é muito, mas ajuda!
Finalmente, veio a Lei 10.886, de 17 de junho de 2004, que aumentou a pena do art. 129 do Código Penal (lesões corporais) quando for contra a mulher, em 1/3 da pena. Que bom! Assim, saindo da proteção da lei 9.099, que acoberta as penas até 1 (um) ano e, sendo a vítima mulher possibilitaria a Autoridade Policial prender e autuar o agressor. Calma! A alegria das mulheres durou pouco.
No dia dos namorados, só de gozação. Em 12 de junho de “2001” apareceu a Lei 10.259 dos Juizados Especiais Federais, que aumentou a proteção dos maridos agressores, estendendo seu manto para 2 (dois) anos! Todo crime, cuja pena vai até 2 (dois) anos está protegido pelo manto do JECRIM, assim como o usuário da maconha que alimenta de armas os traficantes e outros mais.
Atualmente, para piorar a situação das mulheres mais pobres, estas após chegarem à Delegacia, registram o fato e, sendo as lesões visivelmente leves (hematomas, escoriações) os policiais teimam em entregar um documento para a vítima comparecer ao IML, a fim de que façam o exame de corpo de delito. Contudo, o Instituto fica distante da periferia, de modo que estas mulheres não têm dinheiro da passagem para chegarem até lá. Entretanto o procedimento ora abordado é avesso ao art. 77, da lei 9.099/95, já que determina que não haja a necessidade de ir ao Instituto Médico Legal, caso a pessoa seja atendida, preliminarmente, em Posto de Saúde ou qualquer Clínica, bastando juntar um atestado médico descrevendo as lesões.
Recentemente, a Ministra da Ação Social veio a público dizer que o Governo havia criado mecanismos de proteção à mulher. Sem comentários!
NA. As leis não obedecem a ordem cronológica por razões pessoais. "