Um assunto que atualmente não vem tendo destaque na imprensa, mas que volta e meia vem à tona, é a pretensão do Ministério Público em realizar por conta própria a investigação penal.
Não vamos entrar no mérito jurídico desta questão, pois este não é o foco (para se aprofundar no assunto leia o Blog do Delegado Federal Adriano Barbosa), mas existem diversas tendências e julgados, posições que defendem o clichê jurídico “quem pode mais pode menos” e por isso, como o MP é o destinatário do Inquérito Policial pode investigar. Outros que entendem que a Constituição da República Federativa do Brasil ainda valha alguma coisa, e que quando esta disse em seu artigo 144 § 4º que “Às polícias civis, dirigidas por delegados de polícia de carreira, incubem, ressalvada a competência da União, as funções de polícia judiciária e a apuração de infrações penais, exceto as militares” queria dizer exatamente isso. Mas esse não é nosso ponto.
Por que, pergunta-se, tanto interesse em assumir o poder de investigar fatos criminosos, função incubida às polícias judiciárias? Promotores querem investigar. A PM através da P2 quer investigar. Os Senadores, Deputados, Vereadores querem investigar através das CPIs. E as funções destes cargos, quem vai fazer? Ou querem que a polícia judiciária seja a titular da ação penal, a responsável pelo patrulhamento ostensivo e também o poder encarregado em fazer as leis? Se existe uma divisão legal de funções, se alguém escreveu isso tudo em uma Constituição, deve ter algum motivo.
Qual o papel do Ministério Público na Segurança Pública afinal? Não faltam denúncias do abandono da Polícia Civil, não falta denúncias das condições precárias da polícia técnica. E todo esse nosso trabalho, dos investigadores, dos peritos, tudo tem como finalidade fornecer material de qualidade para que o Ministério Público consiga fazer uma boa Denúncia e que dê bases para eventuais condenações nos processos.
Por que os Promotores não lutam por uma Polícia Civil melhor, mais forte, mais independente das políticas? Ao invés de assumir seu papel de fiscal da lei, resolvem eles mesmos fazerem este trabalho, enquanto existe uma instituição constitucionalmente definida para fazê-lo ! Nosso trabalho, enquanto polícia judiciária, nada mais é do que produzir material para o sucesso do trabalho dos Promotores.
Para se ter uma idéia, o Ministério Público criou uma coisa chamada GAP (Grupo de Apoio à Promotoria). Em sua quase totalidade são Policiais Militares que lá trabalham, desviados de sua função legal e desfalcando os batalhões da PM e consequentemente o patrulhamento das ruas. Lá eles fazem investigação sob o comando dos Promotores, representa-se por Busca e Apreensão e pasmem, li notícias até de escutas telefônicas ! Sinceramente, acho que um bom advogado consegue com facilidade acabar com um processo baseados nestas provas. E se não acabar com o processo pelo ao menos o arrastará até que seu cliente morra de velhice, em liberdade.
Um simples exemplo disso foi uma das dezenas de expediente que o MP remete para a Polícia Civil, no qual fui encarregado de investigar (paralelamente aos 325 IPs e 47 VPIs sob minha responsabilidade) possível crime de tráfico de drogas. No expediente, na verdade um esboço de Inquérito, constavam diversas fotografias. Na hora me foi cômico, mas na verdade é trágico. Em uma das fotos, aparecia o “investigador” do GAP segurando um maço de dinheiro em espécie, como que entregando a uma terceira pessoa. Na legenda dizia “momento da entrega do dinheiro arrecadado”. O que seria aquilo?? Uma espécie de Auto de Apreensão e Entrega? O que provava aquilo, que o dono do dinheiro efetivamente o recebeu de volta?? O certo é que era mais uma das “investigações” sem pé nem cabeça, com informações sem nexo e fotografias de igual valor, que não resultou em nada, e como não havia o que fazer com aquilo, “determino a remessa para a Polícia Civil para prosseguir na investigação”!!
Ou o disque-denúncia do MP, que é repassado (não sei se todos né) às Delegacias... teve um em que um cidadão reclamava anonimamente que “existia um posto de gasolina no bairro tal, onde de madrugada havia tráfico de drogas, envolvendo jovens; no mesmo local ainda podia-se ver PMs fazendo uso de cocaína no capout da viatura; em uma praça um sujeito ficava fumando maconha com um cachorro sem fucinheira; e a rua não havia sido asfaltada nem havia esgoto, a despeito do alto valor do IPTU”.
O que me causa inquietação é que eu, se fosse Promotor de Justiça, não iria querer investigar. Iria me aproximar do Delegado daquela Delegacia. Se este fosse um servidor “safado” ou “corrupto” ia cuidar para que este, se não fosse punido, transferido fosse. Eu iria lutar junto com a Polícia e pela Polícia, porque dependeria dela, com boas investigações e Inquéritos Policias bem trabalhados, para o sucesso do meu próprio trabalho, o processo criminal.
O que falta afinal, vontade? Tudo se resume à uma disputa de vaidades? E nós, os cidadãos, como ficamos? Eu quero segurança para andar pelas ruas, sem me preocupar neuroticamente em ser assaltado ou atingido por um tiro.
E vocês, não acham que o MP, com todo o poder que está, com a opinião pública ao seu lado, não poderia ressuscitar o alicerce de suas funções? Não acham que se poderia abandonar o pensamento de que "polícia não presta e tenho nojo", e se aproximar das equipes policiais que agem corretamente, sem se deixar levar por generalizações? Este é nosso debate no post em epígrafe.